Complexidade, Liderança

Por Que o 9 Box Causa Desastres?

Não posso culpar uma matriz no PPT pelos desastres de gerenciamento que encontramos por aí. Afinal, o famoso 9 BOX não é nada além disso: uma matriz 3x3 onde alguém decidiu inputar dados sobre desempenho e potencial de alguns profissionais.

Desempenho é uma dimensão menos polêmica, afinal qualquer gerente que se preze tem um julgamento muito claro sobre o quão bem cada um de seus liderados está realizando suas tarefas. É verdade que o “deep state” organizacional faz de tudo para complicar esse processo, mas isso é assunto para outra thread.

Contudo, quando começamos a falar de potencial, o buraco é mais embaixo e é daí que vem a fama negativa do 9 BOX. Se eu não tenho uma definição clara do que é potencial e não sei como medi-lo, vou alimentar meu 9 BOX com o que?

E nesse ponto que vemos todo tipo de extravagância: potencial se confundindo com personalidade, agilidade de aprendizagem, competências, QI e por aí vai.

Garbage in, garbage out” já diziam os sábios.

Quando um comitê de carreira e sucessão se reúne para falar de potencial, o objetivo é identificar pessoas que poderão trabalhar em níveis mais altos de complexidade (chamamos isso de Work Levels). Grandes empresas tipicamente terão 5 Work Levels, com o CEO no WL-5, seus reportes diretos no WL-4 e assim por diante (algumas corporações podem ter 6 ou 7 WLs e empresas menores, naturalmente, requerem menos níveis).

O ponto chave é que cada um desses Work Levels são bastante diferentes entre si e, naturalmente, são poucas as pessoas que poderão crescer para os níveis mais altos de complexidade de trabalho.

O que determina se uma pessoa pode ou não dar conta do trabalho em um determinado Work Level não é sua personalidade, QI, estilo de aprendizagem, extroversão, dominância, formação acadêmica, conhecimentos ou experiências. O fator diferenciador é a capacidade que ela tem de enxergar variáveis, lidar com abstrações e enxergar ações ao longo de diferentes horizontes de tempo e atuar sem feedback. E, portanto, é isso que qualquer medida de potencial deveria capturar. Como não o fazem, é o 9 BOX que acaba levando a fama de mau.

Na nossa prática junto a nossos clientes não recomendamos o uso do 9 BOX (preferimos o Talent Pool), mas acabamos adquirindo muita experiência em ajustar o seu uso. Como? Simplesmente trazendo um conceito de potencial claro, adequado e mensurável. Não falamos de potencial alto ou baixo… falamos de potencial para que (que nível de trabalho?) e para quando (hoje? daqui a 5 anos? 10 ou 20 anos?).

Se sua empresa tem esse problema com o 9 BOX, você não precisa necessariamente descartá-lo. Comece revendo o que está sendo usado para alimentá-lo e faça os ajustes necessários.

Temos um texto mais completo sobre isso neste link: https://www.pieron.com.br/talent-pool-ou-9-box

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Liderança

Liderando pelas capacidades

Ser líder, liderar, pensar estrategicamente, ser decisivo, realizar, formar equipes, e agora ser ágil num mundo “vuca”, termo cunhado por Jaques e Stamp nos idos dos anos 80 e assumido pelo general Thurman em 1987, conforme memórias do Bioss Intl. Algo mais a dizer sobre liderança? Acrescido da nossa condição atualmente confinada, mas sem se restringir a isso, sim, algo a acrescentar. Chamo a esse algo mais de “liderança pelas capacidades”.

Considere que experimentamos uma turbulência que mistura imprecisões, emoções, tensões, incertezas e necessidades de intuições mais do que previsões sobre o futuro – ver à frente tem mais de intuição e possibilidades do que de cálculo e probabilidades. Em tais condições, cargo é o que menos importa.

O líder é chamado a avaliar as condições, vislumbrar respostas e oferecer caminhos. Então, é tempo de gerenciar pelas capacidades das pessoas. Isto envolve criar um ambiente em que o tamanho e a qualidade das perguntas apontam para o tamanho das capacidades potenciais daqueles que produzirão as respostas. Como não há certezas, a capacidade da pessoa será medida pelo quanto de ambiguidade e incerteza ela consegue sustentar e articular, formar quadros de referências e tomar as decisões necessárias. Mais do que desenhar um projeto, a organização de um grupo em torno do problema é a habilidade gerencial requerida. Não importa mais de que áreas organizacionais virão os recursos. A pergunta será: que capacidades de trabalho são necessárias para responder ao contexto que se configura?

Estruturar tal ambiente e um grupo deveria seguir os princípios ‘requisite’, isto é, o que segue a natureza das coisas. No caso, os princípios da natureza humana para discernir e julgar, diferenciador quando ‘não sabemos – e não é possível saber – o quer fazer’. Sabemos que é nestas condições que estamos efetivamente trabalhando, quando sentimos o peso da responsabilidade (accountability). É quando voltamos para nós mesmos e confiaremos nos nossos julgamentos. É da natureza humana. Tal ambiente saberá respeitar as diferenças de capacidades potenciais, valorizá-las em seus méritos e cuidar para que deem o melhor que puderem, realizando-se.

Se a pergunta é como criar oportunidades para aumentar vendas, quem é responsável por responder a tal pergunta? Se este responsável precisa considerar oportunidades, equilibrar o que acontece ‘fora’ com os recursos ‘de dentro’ da organização, então precisará contar com capacidade suficiente para avaliar os sistemas atuais, redesenhá-los, considerando inovações incrementais, já que benchmark não se aplica na urgência das necessidades. Também vale para o CEO. Quando o propósito e a reputação futura da organização estão em risco, então a questão será escolher em que atividades organizacionais riscos e foco dos investimentos serão definidos e priorizados, à luz da intenção estratégica. E ter as capacidades para pensar em inovações radicais, para criar ações disruptivas e abrir novos caminhos no ambiente será determinante do sucesso.

Capacidade não depende do cargo, é patrimônio das pessoas. E cabe aos líderes compreenderem a demografia da capacidade humana na sua organização, entender quais são aquelas pessoas que anseiam por se envolver com tais perguntas e isso envolve olhar o todo da organização. Afinal, ser ‘ágil’ é um resultado de como a estrutura se organiza e funciona, especialmente como poderá funcionar nas condições em que experiência não conta.

E há meios para se ter tal olhar. Normalmente isto é possível pelo talent pool da organização. Mas, um talent pool centrado nas capacidades para discernir e julgar, para lidar com massas diferentes de informações e variáveis, para se manter motivado em face de incertezas e não se deixar tomar por ansiedades e apreensões. Tal capacidade varia entre as pessoas e a demografia da capacidade humana não se comporta como uma ‘curva normal’ – ela indica que pequenos percentuais serão capazes de prosperar em condições altamente incertas e ambíguas, e num número bem maior estarão aquelas pessoas que se incomodarão com as condições turbulentas, e precisarão estar envolvidas em tarefas e problemas específicos de processos de trabalho.

O modelo mais bem estruturado, validado e praticado em diferentes partes do mundo, de pensar e gerenciar a capacidade humana no trabalho é o Work Levels®. Diferente de tantos outros, o foco está na força de julgamento de uma pessoa sobre as condições com que se depara e está envolvida. Como patrimônio da pessoa, é requisite’, da natureza de cada um, não treinável, mas pode ser compreendida. Em tais condições turbulentas não se procura por atributos tais como tipologias, estilos e equivalentes; procura-se por pessoas em quem podemos confiar decisões de impacto para a organização, e isto envolve liderar pela capacidade humana.

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Liderança

Existe apenas “um perfil ideal” para a liderança gerencial?

É muito comum encontrarmos abordagens comportamentais ao papel da liderança remetendo exclusivamente a determinados “perfis ideais” ou a um determinado tipo psicológico como sendo o mais indicado para a função de liderança.

Realmente existem certos traços (“competências de fundo ou recursos internos”) que possuem correlação com a propensão para o papel de um líder gerencial. Porém, não menos importante, e independentemente de tais traços, a natureza da função de liderança requer a prática de alguns fundamentos.

A liderança poderá expressar-se de muitas formas, dada às múltiplas facetas do ser humano, mas ela não pode prescindir de aspectos de base, que são fundamentais para que o líder seja eficiente.

Estes fundamentos estão para a liderança, assim como o “saque” está para o jogador do Vôlei, por exemplo. Em quadra, cada jogador conhece a sua posição, sabe o que fazer e como contribuir com a equipe. E poderá fazer isto, muitas vezes, com certa dose de criatividade pessoal. Mas todos tem que “saber sacar”. E sabem que, independentemente de seu estilo próprio de sacar, se a bola tocar o chão ela dará um ponto ao seu time. Não mais que um ponto. Isto dá o tom da orientação para o resultado que todos devem ter. Então, para ser excelente neste fundamento, o jogador tem que treinar, treinar e treinar. Pode utilizar o estilo próprio, mas tem que marcar o ponto. Como disse certa vez o Bernardinho (técnico de Vôlei e algumas vezes campeão pela seleção brasileira), “a vontade de treinar, tem que ser maior que a vontade de vencer”.  Portanto, o resultado é, ou deveria ser, uma consequência da aplicação. É evidente que se soma a isto a capacidade, o talento individual, a paixão pelo que se faz e outros fatores que o jogador não controla e que poderão afetar tanto o resultado individual, quanto o coletivo e o resultado final do jogo.

Não é diferente com um profissional que atua sozinho ou em equipe. Não é diferente com a liderança gerencial. O líder precisa encontrar o “ponto ótimo” na relação com as pessoas com as quais interage para, juntos, chegarem aos resultados.  Cada um no seu papel e, todos, muito bem treinados nos fundamentos do próprio trabalho.

A esta altura arrisco dizer que o líder gerencial possui um “Ponto 0” – que significa o equilíbrio entre certas habilidades e sua prática efetiva. E para “chegar lá”, ele precisa treinar, treinar muito e treinar sempre.

Existem alguns fundamentos que ele precisa praticar, e isso independente de ter este ou aquele traço de personalidade, de ter este ou aquele gosto, estilo ou preferência pessoal.

Considerando que o líder gerencial está ocupando uma determinada posição porque fez esta opção, gosta e tem capacidade para tal, ele precisa ter como fundamentos de seu papel:

  1. Construir e manter uma relação de confiança com as pessoas.
  2. Reconhecer que as pessoas querem saber o que delas se espera e como isto se encaixa no quadro geral da sua área e da empresa.
  3. Cuidar para que as pessoas entendam, regularmente, como está o próprio desempenho.
  4. Fornecer recursos, autoridade e facilitar o desenvolvimento da pessoa para que o trabalho seja realizado.

Ao profissional que busca a excelência, não adianta ter muito desejo de alcançar resultados se isto não se fundamenta em muita aplicação e paixão. Da mesma forma, ao líder gerencial não adianta ter vontade de gerenciar e esmerar-se para “se encaixar em um determinado perfil ideal”, se não tiver muita aplicação e paixão pelo seu papel.

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Capacidade, Contexto, Estrutura, Liderança

Posicionamento e capacidade de influência do RH no desenvolvimento dos negócios

Queremos refletir sobre o papel do RH com ou sem crise econômica, deixando de lado a questão do RH ser ou não estratégico e focalizando naquilo que nos parece ser essencial e atemporal: o RH influenciando o desenvolvimento de negócios.

Talvez você já tenha ouvido uma frase assemelhada a essa: “aqui na empresa só existem dois tipos de pessoas, as que vendem e as que ajudam a vender”. É uma forma de dizer que as organizações têm propósitos claros e as distintas contribuições das pessoas nos diversos papéis e áreas funcionais, precisam convergir para ele.

Pensemos agora no posicionamento do RH como função dentro da organização. Um dos critérios que utilizamos para compreender esse posicionamento é o de avaliar quais perguntas vêm da alta direção para RH. Isto é, se você está em tal função, que perguntas seu presidente ou diretores fazem para você? Do outro lado, que perguntas os profissionais de RH gostariam que lhes fossem feitas? Cremos que a natureza das perguntas de um lado e de outro dão um claro significado de como a função de Recursos Humanos é percebida em sua organização. Ou seja, a função é vista como parte do desenvolvimento do negócio, do valor a ser agregado para o futuro ou é parte dos sistemas e processos de controle da gestão do presente? E claro, o quanto os profissionais que lideram o RH se sentem preparados para responder a tais questões e mostrar convicção de onde podem agregar valor?

Outra forma de compreender esse posicionamento é mensurar o quanto sua organização está buscando externamente o apoio de outros especialistas para responder algumas perguntas:

  • Se o momento é de crise, onde encontrar apoio?
  • Se a questão é de revisão dos negócios, onde encontrar aconselhamento?
  • Se a questão é de revisão do modelo organizacional e de gestão, onde encontrar orientação?

Qualquer que fosse a pergunta, o RH seria considerado e estaria presente na maneira COMO estas perguntas seriam respondidas?

Essa reflexão foca COMO o RH pode EFETIVAMENTE agregar valor para o futuro nas organizações e nos negócios.

E pensando em grandes contribuições, olhamos para três dimensões que aparentemente estariam sob a liderança e influência de Recursos Humanos:

  • Estrutura organizacional
  • Desenvolvimento organizacional
  • Desenvolvimento das pessoas (ou dos recursos humanos, se preferir essa expressão)

Estrutura organizacional

Este tema é do domínio de RH? Ou seja, Recursos Humanos compreende que estrutura organizacional se refere ao “esqueleto”, ao desenho organizacional de suas funções alinhadas ao propósito estratégico de longo prazo? E se entende, como se aplica nisso?

Afirmamos que é o tipo de complexidade, ou seja, o tamanho do propósito da organização que define a estrutura requerida para viabilizá-lo. Esta reflexão é válida tanto para definir o propósito estratégico, quanto para redefini-lo.

Em momentos onde as empresas vivem turbulência e crises, que geralmente não se limitam a curtíssimos períodos, são consideradas políticas competitivas, revoluções em funções estratégicas, desbravamentos de caminhos não trilhados e PARA ONDE serão destinados os recursos, quase sempre escassos, da organização.

Nesse contexto o RH é candidato a cortes ou a investimentos? E quando saberá da decisão? Se as reflexões e aconselhamentos vierem “de fora”, então Recursos Humanos deixou de fazer parte do desenvolvimento dos negócios. Se as reflexões vierem “de dentro”, então há uma possibilidade de participação e influência nas decisões. Ou seja, qual a oportunidade efetiva de contribuição de Recursos Humanos?

Os momentos de crises requerem ainda mais foco em um desenho de estrutura que favoreça altos níveis de produtividade e eficiência dos recursos internos.

No caso de RH, isso se aplica na relação entre as pessoas, e entre as pessoas e seus trabalhos. Falamos das relações, e não dos domínios específicos de conhecimento de cada área funcional (finanças, vendas, logística, produção etc.). Falamos ainda, das ações possíveis neste domínio da conversação sobre desenvolvimento dos negócios e estrutura organizacional.

O específico para Recursos Humanos é que possua e ofereça o conhecimento para que os principais decisores da organização façam uma reflexão fundamentada sobre a relação entre o propósito e a estrutura necessária. Em termos ótimos, cada negócio operará em um determinado nível de complexidade no modo como encara e estabelece sua relação com o ambiente externo; isto é, o grau de ambição que tem em relação ao mercado aberto, o grau de protagonismo que quer ter junto a clientes, o grau de inovação que procura desenvolver etc.

O desenho da estrutura deve refletir estas ambições. E há um modelo conceitual que oferece fundamentos para tanto. O modelo Work Levels® oferece exatamente esta possibilidade de conversação entre propósito e desenho estrutural com a mediação de RH. Também é parte deste estágio de reflexão os princípios maiores que nortearão o ‘funcionamento’ da organização. Um exemplo é a meritocracia. Muitas empresas afirmam funcionar assim, meritocraticamente. Mas, com uma análise mais aprofundada, você notará que as práticas e sistemas adotados não refletem exatamente este princípio. E Isso nos leva a uma reflexão sobre accountabilities e authorities.

Numa tradução livre e breve explicação, falamos aqui da prestação de contas que um ocupante de cargo é chamado a prestar e as autoridades que ele possui, para executar o seu trabalho.

Reforçamos que estamos falando de importantes aspectos no desenho de um cargo, dentro de uma estrutura alinhada com a estratégia. E um propósito estratégico típico olhará PARA O HOJE e PARA COMO as condições de hoje estão ou deveriam estar sintonizadas com as condições futuras (5 a 10 anos à frente). Essas duas qualidades requerem aprofundamento porque despertarão atenção sobre aspectos importantíssimos tais como confiança mútua, autonomia, uso da iniciativa e alcance de desempenho além das expectativas. 

É nesse estágio que as reflexões sobre a capacidade potencial existente na organização ganharão peso e importância, visando mensurar se existe capacidade potencial instalada para dar respostas aos desafios atuais e aos que virão.

Novamente, quais perguntas estão sendo formuladas para Recursos Humanos? E quais têm sido as respostas?

Desenvolvimento organizacional

Aqui estamos falando do que decorre direta ou indiretamente da ESTRUTURA EXISTENTE. E já sabemos, é melhor que ela seja exatamente aquela que é requerida pelo propósito estratégico.

O desenvolvimento organizacional deve colocar sua atenção nas práticas e sistemas que sustentam as relações entre as pessoas, e entre as pessoas e seus trabalhos.

Ele deve garantir que os princípios gerais, políticas e valores estejam devidamente presentes em sistemas de gestão por meio dos quais as pessoas perceberão coerência nas diferentes práticas organizacionais. São nessas práticas que, por exemplo, “veremos” a realidade da meritocracia, a coerência da liderança gerencial, os sistemas de comunicação e decisão.

Consequentemente, reforçando a essência desse podcast, a função Recursos Humanos pode ser aquilatada em sua contribuição ao desenvolvimento organizacional, pelo tipo de prestação de contas e pelas autoridades correlatas que lhe são atribuídas e pelo grau de reconhecimento interno com relação ao uso efetivo de tais autoridades. Sem tal clareza de prestação de contas e autoridades e sendo reconhecido exclusivamente por suas interfaces internas, Recursos Humanos continuará sofrendo de crise de identidade e sua contribuição para o desenvolvimento dos negócios não será percebida como coerente e sintonizada com o propósito. 

Desenvolvimento das pessoas, ou dos recursos humanos 

Os investimentos em tempos de crise se tornam escassos. Mas há alguns princípios que por si só ajudam a gerar efeitos no desenvolvimento das pessoas. Elliott Jaques nos ensinou que “mudando a estrutura mudam-se os comportamentos”. Exemplificamos que combinando-se o desenho (ou redesenho) organizacional com princípios meritocráticos, e com clareza de prestação de contas e autoridades, esse novo ambiente mobilizará os recursos (latentes) das pessoas.

O entendimento sobre a natureza humana e trabalho aqui aplicado é bem simples: as pessoas buscam realizar seu potencial num trabalho que lhes seja significativo. São poucos os que querem ser CEOs, mas ninguém quer ver suas capacidades subaproveitadas e sem espaço para mostrar seu potencial de realização.

Essas crenças estão presentes nos sistemas que são praticados?

Daí decorre um segundo princípio que é o desenhar funções onde as pessoas possam experimentar flow. Dito de maneira simples, flow representa uma atitude energizada, intrinsecamente motivada e voltada a realizar, que emerge quando os desafios exigem o melhor de nossas capacidades, num trabalho que valorizamos fazer. Coloque as pessoas em flow e novos resultados aparecerão!

Sendo assim,

é ponto de atenção de Recursos Humanos o conhecimento da capacidade potencial das pessoas, para que possam aplicá-las de forma consistente, em FLOWE aqui não estamos falando do seu perfil comportamental ou tipo psicológico. Outro não menos importante é conhecer e promover as habilidades gerenciais para dirigir, guiar e trazer as pessoas para a governança das ações da área ou departamento.

Novamente, aqui, na identificação e transformação do potencial em desempenho, é possível observar o grau de coerência entre propósito, valores e sistemas de gestão.

E quanto ao treinamento?

Gestores capacitados e que valorizam pessoas conduzirão os próprios processos de coaching (o que é um accountability gerencial). Forme gestores como coaches, caso eles não saibam como fazer, e eles cuidarão do resto!

Finalmente, o que aparece em muitas empresas é que Recursos Humanos parece buscar agregar valor valendo-se do paradigma do “administrador” (como oposto às ciências das pessoas).

A etimologia da palavra talvez ajude a (re)encontrar um significado. Administração vem do latim “admnistratio, ónis”. Um dos significados é que se trata da ação de prestar ajuda. “Ad” vem de agregar, significa aproximação, como “addgregare” que significa “juntar todo o rebanho”. Assim, ao pensar em agregar valor pense: “em todas as ovelhas que compõem o rebanho chamado valor”.

Assim, RH poderia fugir da pura aplicação do termo “administração” como gestão, com o risco de repetir paradigmas puramente “administrativos”.

Mas, no caso de RH, gestão do que? As pessoas estão sob liderança dos gerentes.

Agora tomemos a palavra “manager” – separando “man” e “ager”. Teremos um significado tal como o homem que faz o outro crescer (ager). Então, o gerente é que “gera”, agrega valor ao crescimento das pessoas.

E Recursos Humanos precisa se ver com a prestação de contas e com autoridades formais e equivalentes para que a “ajuda” ou o “valor agregado” esteja na interface entre gestores e pessoas, atuando para que as práticas organizacionais sejam coerentes com o propósito e os requisitos da natureza humana no trabalho.

É nessa interface que as coisas acontecem, onde o propósito organizacional se realiza, onde as políticas são percebidas e os valores praticados.

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Liderança

Coach como designer

Certas ações, atitudes e, principalmente, valores, parecem permear a ação de um líder-coach. Compartilho algumas que se tornaram evidentes em nossa prática.

  1. O foco do coaching está no processo que busca obter melhores níveis de desempenho. Se o liderado estiver iniciando na função, o foco será garantir uma efetiva integração social para que a melhor performance ocorra rapidamente.
  2. O líder – como coach – interessa-se profundamente pelas pessoas, suas características, o que elas têm de melhor. Faz parte dos valores do coach este interesse. Ele sabe que as pessoas não mudam suas personalidades como trocam de roupa, e nem se tornarão intelectualmente diferentes do dia para a noite.
  3. O líder-coach escolhe com quem quer trabalhar. Forma sua equipe. E se coloca no papel de provedor.
  4. Como coach, e como líder, atribui responsabilidades e transmite confiança na capacidade das pessoas em usarem seus julgamentos.
  5. O líder-coach mantém canais abertos para a troca de feedback, e não gasta dinheiro com processos formais de avaliação 360 graus. Ele age em 360 graus. E sempre investe no auto e hetero conhecimento. E trata isto com humildade.
  6. O líder-coach interessa-se em compreender os limites do potencial de seus liderados. Sabe o quanto a permanência de seu liderado em determinada função trará benefícios para o liderado e para o grupo; e está atento ao momento em que o potencial do liderado começa a se mostrar maior que o cargo.
  7. O líder-coach também está atento aos motivos que levam o seu liderado a não desempenhar o seu melhor dentro do escopo de função.
  8. Agora, o líder-coach será um designer. Cada pessoa tem suas singularidades. Provavelmente, o bom líder-coach já as conhece.
  9. O bom designer considera as particularidades do porquê certas pessoas não desempenham tanto quanto poderiam.
  10. designer analisa a relação do liderado com as tarefas e constrói situações para que o liderado se surpreenda, se motive e explore o que percebe como limitações, para que ouse experimentar.
  11. O líder-coach sabe que mudanças de atitude passam por revisões de crenças, valores, e que para que as pessoas atuem em um novo patamar de comportamento, será necessário estar presente e ‘trabalhar’ com o liderado.
  12. designer é engenhoso. Enxerga à frente. Vislumbra meios para expor seu liderado – com segurança – a novas maneiras de abordar tarefas, relações e decisões.
  13. O líder-coach tem paciência com este processo, e urgência com o desenvolvimento.
  14. O líder-coach e o liderado precisam-se mutuamente.
  15. O liderado só reconhece um líder quando este é capaz de agregar valor ao trabalho do liderado. Do contrário, esta será uma relação submissa, passiva ou formal.
  16. O líder-coach tem claro que é o responsável pelo output de seus liderados. Caso contrário, não haverá esforço de sua parte para manter-se continuamente acompanhando e aprendendo sobre cada liderado, sobre a própria equipe. Ele terá evidências para um processo de apreciação do desempenho percebido como justo.

Uma liderança gerencial com ações em coaching não requer super-pessoas. Liderar é coisa para mortais, gente como nós. Gente que tem nos seus valores um profundo interesse pelas pessoas, tal como elas são, e gente que quer contribuir com um ambiente melhor em torno de si mesmo.

Nota: Artigo publicado originalmente no antigo site do Instituto Pieron.

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Liderança

Você é um gerente de verdade?

O que define um gerente?

Antes de responder, preciso tratar da questão dos Gs para evitar possíveis confusões.

Gerente com G maiúsculo nada mais é do que um título, tal como Coordenador, Diretor, Analista ou Vice Presidente. Títulos servem para representar em qual estrato organizacional uma determinada posição está e qual é a sua função.

Quando falo de gerente, com g minúsculo, me refiro à propriedade de uma determinada posição. E é dessa propriedade que quero tratar neste post.

Então, o que define um gerente?

Vamos lá: a característica mais marcante de uma posição gerencial é que seu ocupante (o gerente, também conhecido como gestor) será pessoalmente responsabilizado, não apenas por sua própria eficácia, mas também pelo resultado do trabalho dos seus subordinados. Ninguém quer gerentes que deem com os ombros ou transfiram a culpa para seus subordinados quando a coisa fica feia.

Vou para por aqui com os negritos nos Gs. O ponto já foi feito.

Agora vem o pulo do gato: para que um gerente possa ser responsabilizado, de forma justa, pelo resultado dos seus subordinados, ele precisa de algumas autoridades mínimas. Sem essas autoridades, inicialmente observadas e listadas por Elliott Jaques, não se pode dizer que tal posição é gerencial ou que o seu ocupante é um gerente:

  • Vetar a seleção: Se eu, como gerente, serei responsabilizado pelo trabalho dos meus subordinados, não posso ser obrigado a aceitar alguém que não acredito ser adequado para o trabalho. Isso não significa que possa sair contratando qualquer pessoa a meu bel-prazer, já que normalmente existem políticas organizacionais que tratam do assunto. Mas, de qualquer forma, eu tenho que ter veto para ser chamado de gerente.
  • Atribuir tarefas: Se eu, como gerente, serei responsabilizado pelo trabalho dos meus subordinados, somente eu posso definir, priorizar e alocar o trabalho entre eles.
  • Reconhecer, revisar e remunerar o desempenho de forma diferenciada: Se sou eu, como gerente, que atribuo tarefas aos meus subordinados, somente eu posso julgar e reconhecer (dentro das políticas aplicáveis) sua eficácia na realização do trabalho. Sim, isso inclui avaliação de desempenho, remuneração diferenciada, remuneração variável e qualquer outro sistema que envolva reconhecer, revisar e remunerar. É claro que existem políticas para isso, mas, dentro de tais políticas, a decisão tem que ser minha.
  • Iniciar remoção da posição: Da mesma forma que eu, como gerente, tenho autoridade para vetar a seleção de qualquer pessoa para a minha equipe, tenho que ter a autoridade para iniciar a remoção de alguém que acredito não estar mais à altura do trabalho. Notem que isso não quer dizer demitir alguém de uma organização, já que podem existir políticas de realocação interna antes que uma demissão seja realizada.

Lógico, não é? Mas nem sempre é isso que encontramos no mundo real. Veja algumas lamentações bastantes comuns:

  • Não posso mais decidir sobre a avaliação de desempenho dos meus subordinados. Agora estão usado uma avaliação 360 graus para isso. Dizem que assim as avaliações ficam mais justas” – Aqui o gerente se tornou apenas mais um a julgar o desempenho dos seus subordinados. Aberrações, como ter um subordinado julgando o desempenho do seu gerente, não são incomuns no mundo real.
  • Meu chefe me fez aceitar um novo Analista na minha equipe. Ele foi indicado por um conhecido dele. Eu disse que não achava um boa escolha, mas não teve jeito” – Como que o gerente, neste caso, poderia ser responsabilizado pelo desempenho deste subordinado?
  • Meu Diretor foi falar diretamente com um Coordenador da minha equipe e disse para ela parar tudo que está fazendo pelas próximas duas semanas para focar num outro projeto” – Aqui fica bem claro que o Gerente em questão não é o gerente de fato.

A pergunta mais frequente que se segue é a seguinte: “Mas isso não é poder demais nas mãos dos gerentes“?

Diria que não.

Essas autoridades são as mínimas, necessárias e suficientes para que os gerentes possam, de fato, ser responsabilizados e cobrados pelo desempenho das suas equipes. Sem desculpas. Sem chororô. E vale lembrar que todo gerente (exceto o Diretor Presidente ou equivalente) é subordinado a outro gerente e, portanto, deveria ser responsabilizado pelo bom uso das suas autoridades.

Sem autoridades claras, não há treinamento de liderança que dê conta do recado.

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Liderança

Porque os líderes gerenciais não deveriam ser descartados do papel de coach

Proponho o tema com base no meu livro – Confiança entre líderes e liderados. A tese era que quando líderes e liderados estão em condição de flow, a confiança é mútua. Quando essa relação é ótima os depoimentos de entrevistados são claros: esperam receber confiança a respeito de suas capacidades de usar os próprios julgamentos, esperam accountabilities e autoridades para decidirem dentro de limites estabelecidos. Desafortunadamente, apenas 10% dos pares entre líderes e liderados mantinham uma relação flow/flow e de confiança mútua. Estes – privilegiados? – transmitiam uma sensação de ‘destino compartilhado’ que fazia os olhos brilharem, mais do que nunca, por sentirem-se engajados, engajados consigo mesmos, pois o flow gera esta experiência de ‘tempo que passa rápido’, que tudo o que faço faz sentido, de que minhas capacidades são testadas em seus limites, de que a recompensa intrínseca pelo que faço está além dos limites esperados pelo contrato formal com o trabalho. Com confiança mútua.

Com base nisto é que acredito que o título acima merece atenção. Se você, gestor, alguma vez aceitou alguém, que não você mesmo, como coach de um de seus liderados, você foi descartado. E, pior, você negou seu papel de liderança gerencial. Há culpados aqui? O culpado é a terceirização da função de coach? É a falta de tempo? É porque o assunto ‘comportamento’ ou os assuntos que têm a ver com ‘pessoas’ não competem ao líder gerencial?

Discutir o tema envolve considerar alguns princípios que guiem a discussão. Coloco três para reflexão. O primeiro é que liderança gerencial não é um cargo, é um papel social assumido por uma pessoa que aceita ser responsável pelos resultados de outros, e que é reconhecido pela organização. O segundo é que um líder gerencial é, de fato, responsável pelos resultados de seus liderados. O terceiro, é que a função de coach é inerente ao papel de líder gerencial – o que me parece óbvio.

Algumas palavras sobre os três princípios. Primeiro. Liderança gerencial é um papel social publicamente visível. Há um contrato psicológico entre líder e liderados onde estes aceitam a liderança do outro e se comprometem a aplicar o melhor de seus esforços na busca dos propósitos definidos pela liderança. Não é um cargo. O líder gerencial tem a seu ‘cargo’ a responsabilidade da guiar outros e, ao mesmo tempo, a de produzir seus próprios outputs que caracterizam as suas contribuições pessoais (sob a liderança de outra pessoa). Segundo. Responsabilidade pelo ‘output’ dos liderados. Para tal, as responsabilidades envolvem formar uma equipe com espírito realizador, escolher com quem trabalhar, reconhecer o desempenho, afastar aqueles que não atendem às expectativas. Terceiro. Como ser responsável pelo output dos liderados se não os acompanho, se não os coordeno, se não identifico o que potencialmente pode dar errado ou não está caminhando bem, com os liderados?

Assim sendo, o líder gerencial precisará de alguns poucos requisitos para plenamente exercer seu papel social: valorizar assumir tal papel e se sentir comprometido em conduzir os requisitos gerenciais. Isso nada tem a ver com o ‘tipo de personalidade de liderança’ ou tipologias de qualquer natureza. Envolve uma combinação equilibrada de accountabilities e autoridades. Dentro dos requisitos destaco:

  • Reuniões regulares com todos os subordinados imediatos para discutir contexto, planos, problemas e sugestões;
  • Definir contexto: atualizações frequentes das bases dentro do que o trabalho precisa ser conduzido;
  • Planejamento: apresentação de caminhos alternativos para lidar com os problemas, e para assegurar que os liderados compreendam e tragam seus inputs;
  • Atribuição de tarefas: Atribuir tarefas que definem os limites do trabalho, o tempo e padrões esperados.
  • Apreciação do desempenho: julgar o quão bem os liderados estão trabalhando e canalizando seus melhores esforços para realizar os objetivos, e discutir com eles.
  • Revisão de mérito: julgar e conduzir discussões periódicas com relação à efetividade pessoal de cada liderado, e conduzir avaliações anuais a respeito do como os liderados aplicam suas capacidades de trabalho e decidir sobre bandas de remuneração;
  • Coaching: ajudar os liderados a aprender como lidar com uma variedade de processos que ocorrem dentro da unidade de trabalho, de modo que possam avançar em suas funções.
  • Selecionar e integrar.
  • Remover ou demitir (não necessariamente).
  • Melhoria contínua.

Não há nada de misterioso nisso tudo. E se você não concorda com aqueles princípios (ou sua organização entende que não deva praticá-los), então ser descartado do papel de coach não faz a menor diferença. E se isso acontece provavelmente seus liderados não o reconhecem como líder deles! Aí cabe a pergunta: ‘o que é que você espera de um papel de líder gerencial’ (e que não incluiria ser coach)? A contrapartida poderia ser ‘Ah, eu não sei como praticar o coaching com meus liderados’. Bem, aí temos um bom começo. Se não sabe, então pode aprender (desde que você valorize liderar pessoas). Considerando que aceitou o papel de líder gerencial então “não saber + valorizar ser = querer aprender”, querer praticar e querer assumir a responsabilidade de coach.

Reforço um pouco mais a discussão. coaching praticado pelo líder gerencial tem como perspectiva criar um contexto para o desempenho do liderado, apontar para o propósito, transmitir-lhe confiança na capacidade de julgar e optar por um caminho, e acompanhar o empenho e esforços dos liderados para realizar os desafios atribuídos dentro de um horizonte de tempo definido e dos recursos disponibilizados. Envolve tornar o liderado accountable e com as autoridades equivalentes. Caso algo não caminhe bem, então o coaching é necessário para que o liderado compreenda a amplitude do seu cargo, o quão distante poderia estar das expectativas, como está mobilizando suas capacidades e usando os recursos disponíveis em favor da realização do propósito. Interessante! O processo do coaching está interessado na relação entre a pessoa e os resultados esperados. O líder gerencial estará interessado (e motivado por) nas dificuldades para alcançar tais resultados e no como poderá mostrar, orientar, treinar, guiar, dar apoio, dar os recursos necessários para que tal aconteça. Envolve comportamento? Claro que sim. Comportamentos são aspectos observáveis das pessoas tais como fazer perguntas, como a pessoa comunica os acontecimentos, como procura pelos outros, como reage nas reuniões de trabalho, como escreve, como analisa, que iniciativa toma para buscar e construir colaboração, como reage a frustrações nas relações de trabalho, como compreende seu papel e dos colegas e pares, enfim, inúmeros. Mas, também, como a pessoa julga e toma decisões, como avalia as condições existentes e como projeta suas ações para buscar os resultados. Essas dimensões são diretamente acessíveis ao líder gerencial. Claro, um líder gerencial não será um ‘big brother’ acompanhando seus liderados em todas e quaisquer circunstâncias. Mas o líder gerencial criou condições de confiança mútua na relação entre eles e terá aqueles momentos frequentes de acompanhamento, de revisões, de conversas sobre a evolução do trabalho, sobre as dificuldades, e encontrará as oportunidades de praticar as habilidades necessárias. Digo frequentes, e não a rotina de final de ano. Não há nada de transcendental nisso. Fazemos muito disso com colegas, amigos, parceiros.

Mas há que diferenciar. Um líder gerencial coach não é um ‘psicoterapeuta’. Essas questões cabem a especialistas. Na maioria das vezes ele é um líder gerencial e também um liderado e o contexto do trabalho envolve questões específicas que afetam o ‘bem-estar’ da pessoa no seu ambiente, dentro do grupo e na relação com seu líder. Envolve expectativas por resultados e é responsabilidade do líder compreender e intervir no quão bem seu liderado está caminhando na direção deles (resultados). Nesse sentido o coaching gerencial é uma questão extremamente pragmática. Tudo o que fugir dos limites do trabalho ou da experiência, sensibilidade e conhecimentos do líder gerencial devem ser tratados por outras abordagens, que não as gerenciais. Se algo transcende as competências do líder gerencial, então cabe orientar, sugerir e aconselhar a buscar apoio, provavelmente de profissionais especificamente preparados. Algumas organizações possuem serviços de apoio para tal.

Vale também considerar que o coaching gerencial não é uma discussão sobre carreira e futuro. O foco está muito no presente, na relação da pessoa com seu trabalho e o ambiente social a que pertence na organização. Algumas empresas têm o papel do mentoring – alguém com pelo menos um nível acima do líder gerencial – para que certas questões das políticas mais gerais da organização, compreensão das perspectivas do negócio e mesmo das carreiras possam ser abordados e servirem de reflexão para uma orientação para o longo prazo. De certa forma o coaching gerencial se insere no ciclo da gestão do desempenho e está muito preocupado com o pleno uso dos recursos e potencialidades dos liderados.

Por que o líder gerencial não pode ser descartado? Nessa dimensão de entendimento, os recursos disponíveis para o desempenho do liderado estão sob a responsabilidade do líder gerencial. Assim sendo, o líder gerencial tem todas as condições para conduzir o papel de coach de uma maneira realista e focada em garantir que ‘não perca’ o seu liderado. Afinal, no limite, demitir alguém seria como que um atestado de que os sistemas de gestão de pessoas talvez não tenham funcionado tão bem!

Mas, e as pessoas lideradas que sentem que seus líderes não praticam coaching com elas? Assumo como princípio para explorar essa pergunta que estamos falando de um sistema meritocrático. Se assim o é, não haveria o porquê da pergunta. Mas ela existe. Numa unidade produtiva mínima dentro de uma organização há pelo menos três protagonistas ou níveis: o liderado, o líder e o líder do líder. É responsabilidade do líder do líder compreender o quanto seus liderados estão se empenhando para exercer seus papéis de liderança (o que inclui coaching). Na perspectiva de Elliott Jaques1, qualquer trabalhador tem alguns direitos. Destaco dois: direito de ter seu potencial plenamente realizado e o direito a recorrer sobre o como é avaliado. Esta última pode até soar estranho para alguns. Envolve um paradigma muito comum nos processos de avaliação de desempenho2. Este paradigma é o da autoavaliação do liderado quando da reunião de feedback do desempenho. Veja, se estamos falando de organizações com valores meritocráticos e de accountabilities e autoridades claras, é responsabilidade do gestor julgar o desempenho do seu liderado e compartilhar o seu julgamento. Daí a importância do preparo do gestor como líder gerencial em ter detalhes sobre o desempenho e estar preparado para as reuniões. O líder gerencial é quem define o escopo de trabalho do liderado, é ele quem atribui responsabilidades, prazos e recursos, e é ele que conta com o desempenho do liderado para o bem do desempenho da área ou departamento. Um liderado que se sinta injustiçado naturalmente deve ter algum caminho para trazer as suas insatisfações, o que envolve uma cultura organizacional muito específica e de confiança mútua. Além disto, o interesse do líder está em fazer com que o desempenho do liderado evolua, e seus julgamentos devem estar orientados para caracterizar tanto o que percebe quanto o que espera de cada liderado, o que abrirá as oportunidades para o coaching gerencial. Se uma organização não reconhece e não garante tais direitos muito provavelmente a liderança gerencial pode não canalizar plenamente sua atenção para as questões do como contribuir com o desenvolvimento das pessoas no trabalho. E, talvez, também não se preocupem se o papel de coach do líder gerencial está sendo descartado.

Há temas que transcendem as questões do trabalho. Em geral envolvem categorias ligadas a padrões psicológicos, crises ou dúvidas existenciais, relações matrimoniais, com filhos que, sem dúvida, podem impactar as relações de trabalho. Mas não é da competência do líder gerencial envolver-se com eles para conduzi-los. Claro, com sua experiência de vida, pode dedicar tempo para ouvir seu liderado, sensibilizar-se com as questões e por fim, fazer recomendações do como a pessoa poderia buscar algum apoio. Muitas organizações possuem serviços de orientação, convênios, serviços externos. Mas, nestes domínios, o líder gerencial não tem responsabilidade por conduzir qualquer intervenção.

Por fim, conduzi uma reflexão tão somente na perspectiva da liderança gerencial e no que entendo que caracteriza o papel do coach numa organização. No meu livro Confiança entre líderes e liderados3 retomo as palavras de Gillian Stamp: “líderes gerenciais são pessoas que entendem que liderança gerencial não é um ‘cargo’, é um papel social e, como tal, afeta o destino daqueles com quem trabalha e, ao mesmo tempo, assumem as incertezas de um ‘destino compartilhado’ com seus liderados.”

E, então, o que é o coach externo? Bem, deixo para você essa reflexão. Talvez envolva qualquer coisa que não seja a responsabilidade do líder gerencial, mas também não de especialistas, tal como psicoterapeutas. Daí que cabe uma observação. Coaches externos não têm responsabilidade pelo desempenho do liderado, não têm autonomia sobre os recursos disponíveis, não tem autoridade para definir as tarefas dos liderados, como também não os têm os liderados.

 Referências

  • Jaques, Elliott; Requisite Organization. USA. Cason-Hall Publishers, 1997
  • Grote, Dick; How to be good at performance appraisal. USA. Harvard Business Review; 2011
  • Bruno, M.L. Confiança entre líderes e liderados. São Paulo. Biblioteca24horas. 2016

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[vc_row][vc_column][vc_column_text]Texto original de 13/03/2017

Pieron Reflexões

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Capacidade, Estrutura, Liderança

Desenvolvimento do Talento

Compreendemos o talento sob duas dimensões. Uma – a não treinável – tem a ver com o nível de complexidade e incerteza de que se é capaz de lidar quando se tem um objetivo a ser alcançado dentro de um prazo definido. Chamamos isto de capacidade potencial e, neste sentido, o sistema Work Levels prevê sete níveis de talento nas organizações.

A segunda dimensão tem a ver com a aplicação da capacidade potencial, o que requer conhecimentos hábeis (para coisas e para pessoas) para que se possa lidar com os problemas, ter comprometimento e controle sobre os próprios traços de personalidade.

Chamamos de maturação o crescimento orgânico da capacidade humana em direção a níveis de complexidade maiores ao longo do tempo. Algo não treinável, e que é a matéria-prima do talento. Chamamos de desenvolvimento as possibilidades de aquisição dos conhecimentos hábeis para aplicar a capacidade potencial. Confunde-se muito capacidade potencial com conhecimentos hábeis. O primeiro – capacidade potencial – tem a ver com o uso do julgamento. O poder de discernir, julgar, enxergar à frente, não se aprende nos bancos de escola.

Desenvolver talentos inclui duas etapas. A organização precisa saber identificá-los – avaliar o potencial atual e futuro (a longo prazo) – para depois praticar o desenvolvimento. Este desenvolvimento está sob controle da gestão.

O princípio básico é que a responsabilidade pela carreira é da pessoa. Uma companhia não pode garantir as oportunidades, mas pode assegurar que dispõe de procedimentos para capacitar as pessoas a clarificar seus objetivos em relação às oportunidades e, principalmente, dispor de ferramentas confiáveis para julgar o potencial de seus colaboradores.

Numa organização como a definida pelos Work Levels, as responsabilidades são: no Estrato V, o CEO olha para os talentos dos Estratos III, a fim de identificar futuros diretores. Um board olha para os talentos do estrato IV, como potenciais sucessores do CEO. Diretores, no Estrato IV, ficam atentos aos profissionais no Estrato II. E assim por diante, tornando o processo de identificação de capacidade potencial e planejamento de carreira e sucessão algo natural dentro da organização.

O Desenvolvimento de cada pessoa

Coaching

Os gerentes, em relação a seus liderados diretos, lidam com as questões do desempenho imediato do trabalho. Precisam praticar o coaching regularmente, visando ajudar seus liderados a desenvolver suas plenas capacidades (potencial).

Coaching é ensinar, treinar (o uso hábil do conhecimento) e isto envolve a extensão do conhecimento necessário, sua aplicação hábil, articulação focada dos valores, e reforço da sabedoria adquirida. Problemas de personalidade não são foco do coaching. Devem ser apontados e discutidos com os liderados de modo a ajudá-los a ter melhor controle sobre si ou até mesmo procurar ajuda especializada, se for o caso.

Mentoring

Gerentes dois estratos acima dos liderados lidam com as questões de carreira. Participam da avaliação do potencial atual e futuro e de sua revisão periódica. Fornecem informações sobre as oportunidades de carreira na companhia. Apoiam os liderados dos estratos abaixo a definir objetivos e a persegui-los. Também asseguram que seus liderados diretos estejam acompanhando os talentos dois estratos abaixo. Mais ainda: esses mentores devem antecipar o ponto quando liderados dois estratos abaixo estiverem na condição de evoluir para uma posição um estrato acima e começar a prepará-los, mesmo sem a promessa de promoção, o que deve sempre ficar claro.

É também função do mentoring alertar os liderados de que eventualmente deverão procurar outras oportunidades fora da companhia, conforme o caso e situação. Aqui, a franqueza dever ser encorajadora e planejada, de modo a sustentar decisões conscientes de ambos os lados.

Personalidade e carreira técnica exclusiva

Não há comprovação de que determinados traços de personalidade estão associados à liderança. As pessoas podem aspirar posições técnicas ou gerenciais, por seus valores (isto é, o que querem fazer). Mas devem ser alertadas sobre a demanda das posições para fazer suas escolhas. Conhecimentos hábeis podem ser adquiridos, e este é o espírito do desenvolvimento. Capacidade para lidar com incertezas nas tomadas de decisão não é desenvolvível, mas matura com o tempo. Daí a função do mentoring, que terá condições de favorecer a realização do potencial em prazos mais longos.

A arte está na ação gerencial responsável pelo desenvolvimento do talento. O talento é parte do indivíduo, seu diferencial. A composição do Talent Pool (figura abaixo) é essencial para esta prática.

Desenvolvimento do talento sob a ótica do Talent Pool

Apenas com ele se pode visualizar os padrões de crescimento da capacidade das pessoas e sustentar uma prática de mentoring dirigida para a realização do potencial humano nas organizações.

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Cultura, Liderança

Gestão em ambientes de home office

É de senso comum que as relações sociais e de trabalho precisaram ser alteradas com a pandemia do coronavírus. A necessidade imperativa do isolamento social demanda ações da empresa de configurar uma maneira “diferente” de proteger as pessoas e de mantê-las produtivas – em casa.

É claro que muitas atividades requerem a presença física do trabalhador: um operário que maneja uma máquina de produção, a empregada doméstica, os profissionais de saúde, dentistas, médicos, enfermeiros etc. No entanto, muitas das atividades administrativas e técnicas, de natureza mais relacionada com dados e informações – como contadores, analistas, compradores – ou que dependam da inspiração mental – como o caso dos jornalistas, desenvolvedores de jogos, websites e softwares – podem muito bem serem feitas, com a mesma qualidade, de casa.

Uma recente pesquisa da Mercer sobre home office identificou, entre as mais de 800 empresas consultadas, que 75% delas usam esta prática por diferentes motivos, como custos, benefício ao profissional e qualidade de vida. O trabalho em casa, requer um perfil profissional adaptado a essa rotina, envolve disciplina, organização, silencio, espaço físico coerente com a atividade, onde a rotina do lar não interfira nessa dinâmica.

Envolve investimentos da organização, caso empregado, em recursos de computadores, smartphone, acesso remoto de internet, sistemas, para promover o conforto e condições necessários ao profissional para trabalhar. Envolve o perfil “ideal” de profissional que se adapte melhor a atividades com menos contato social, menos interação entre colegas, e menos oportunidades para o “olho no olho”.

Ficou perceptível nesta pandemia, o quanto o isolamento afetou muitas pessoas, que “precisam” sair de casa, conversar, ter uma rotina de ida ao banco, ao supermercado; e sem isso há um impacto direto em estados de humor. Outras pessoas veem nisso um certo conforto, o isolamento como oportunidade para estar com a família, poder pensar sem ser interrompido, construir a própria rotina.

Teremos, no futuro, que selecionar pessoas com perfil para o trabalho no escritório e para o home office. Profissionais com falta de mobilidade, que exijam muitos recursos de acessibilidade, serão elegíveis para os trabalhos, com as mesmas condições de igualdade, em qualquer empresa que ofereça esta modalidade de trabalho.

No aspecto da liderança, muitas coisas precisarão ser consideradas. O sentimento de “perda de controle” sobre a produtividade do profissional poderá ser entendida como um dano para o gestor. Uma das condições básicas para essa situação está relacionada com a confiança. Pode haver dúvida se ele está realmente trabalhando, se vai conseguir entregar o trabalho no prazo definido, se está cumprindo a jornada de trabalho.

Uma relação com base na confiança envolve crença na capacidade do liderado tomar as melhores decisões, no discernimento sobre seu papel e responsabilidades, e isso implica em limites previamente estabelecidos e que serão os elementos para aprimoramento e recompensa. O líder gerencial precisa confiar na capacidade técnica da equipe, porque ele foi o responsável por formá-la e capacitá-la e dar a liberdade para que atue e decida. É fundamental uma relação transparente, aberta e coerente, onde objetivos, metas, expectativas são devidamente esclarecidos.

O gerente precisa confiar em si mesmo e na sua capacidade de escolher os profissionais adequados para as posições, delegar de acordo com tal capacidade, cobrar desempenho confiante, nos recursos disponíveis do indivíduo, e recompensar devidamente. Tudo isso, independente da pessoa estar fisicamente presente ou “online”.

O resultado a ser controlado está na qualidade da entrega dos trabalhos. O valor agora está na comunicação, na transparência das informações, no diálogo preciso em termos de “o quê para quando” e em “quais condições”; e o gestor aí neste meio, como o grande favorecedor das melhores condições de trabalho para o liderado. O sentido da delegação eficiente parte das relações de confiança.

Assim, num momento pós pandemia, um processo de identificação e capacitação de gestores será fundamental, para que as organizações possam perceber as vantagens de trabalhar de forma otimizada, confiante na capacidade das pessoas, dando espaços para que todos possam crescer e exercitar a sua melhor forma de entregar resultados.

 Aqui, a tecnologia será um elemento fundamental para garantir meios eficientes de avaliação do desempenho das pessoas, com critérios e indicadores bem definidos, em plataformas sistemicamente bem encadeadas, que permitam relacionar desempenho com o nível de impacto sobre os diferentes processos e sistemas. Assim, a importância do trinômio papel humano, gestão eficiente e recursos tecnológicos, que pode, se bem articulado, pode resultar em pessoas felizes, motivadas e entregando acima das expectativas.

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Cultura, Liderança, Recursos Humanos, Sem categoria

A Terceira Doença Mortal do Gerenciamento

Deming mantinha uma lista das 7 doenças mortais do gerenciamento.

E muitos se surpreendem quando leem o item #3: Evaluation of performance, merit rating, or annual review.

Sim, a prática de avaliação de desempenho (normalmente anual) é tão difundida e onipresente, que deve ser produtiva, certo?

Deming sabia que não.

Ou você tem “qualidade total” (o termo da época) ou você tem avaliações de desempenho anuais. Os dois juntos não combinam.

Um motivo?

“The fact is that the system that people work in and the interaction with people may account for 90 or 95 percent of performance”, nas palavras do próprio.

E Deming estava bem acompanhado. Elliott Jaques também criticava o foco excessivo das empresas nas “personalidades”, sendo que os problemas (ou oportunidades, se você gosta desse jogo de palavras) quase sempre estão nos sistemas.

A diferença é que Jaques propunha algo diferente para as avaliações de desempenho: a avaliação de efetividade pessoal (assunto para outro post).

Mas o que une Deming e Jaques é a atenção aos sistemas. No caso de Jaques, os sistemas de gerenciamento, incluindo a estrutura organizacional (fonte inesgotável de problemas, mesmo que a solução seja simples).

Ou seja: “A bad system will beat a good person every time”

Poucos discordam desta frase (também de Deming), mas o problem solving ainda mais predominante é perguntar “quem?” e buscar culpados.

Deming deve estar sorrindo de onde estiver ao ver que, quase trinta anos após sua morte, algumas empresas estão finalmente tirando de campo uma prática que ele criticava há muito tempo.

Nunca é tarde para consertar sistemas.

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