Existe algum efeito danoso das jornadas extenuantes na produtividade, saúde e carreira das pessoas, certamente é uma pergunta que muitos de nós vive querendo resposta.
Indo direto ao ponto –> SIM, se deixar levar por um modelo de trabalho que leva à exaustão física, mental e psicológica pode causar danos irreversíveis à sua saúde, produtividade, carreira e vida. É evidente ser necessário, algumas vezes, empreender jornadas “fora do normal”. Situações de crise, picos de demanda, projetos em fases críticas…
Há situações típicas onde se operar acima da capacidade é vital. Quantas vezes, como motoristas, nos vemos ocasionalmente obrigados a levar aos píncaros, as rotações do pobre motorzinho (ou motorzão) do nosso automóvel, em momentos de ultrapassagens mal calculadas ou para fugir de situações de perigo que inesperadamente apareceram à nossa frente e a nossa revelia.
Mas, você já viu alguém em sã consciência manter em níveis altos o giro do motor do carro por mais do que poucos segundos? Você já viu uma cozinheira ou um chef deixar um liquidificador em sua rotação máxima por mais do que poucos minutos. Será que alguém desconhece a resposta?
É senso comum a questão da capabilidade (ou capacidade) inerente a qualquer sistema. Sim, é possível operar acima da própria capacidade, por um tempo. Nunca por todo o tempo. Sabemos bem as consequências.
O intrigante é tentar compreender porque significativa parte das empresas desconsidera isso parcialmente.. Digo parcialmente porque, nunca vi uma empresa operar suas máquinas além dos limites de capacidade conhecidas e especificadas pelo fabricante, por tempo indeterminado. O que me pergunto é por que o fazem com as pessoas?
Entendo menos ainda, por que nós, as tais pessoas, nos conformamos com esse abuso?
Medo de perder o emprego? Ah, se esta estiver sendo a sua resposta é só porque você nunca perdeu seu emprego . Quem já viveu esta experiência sabe bem o quanto isso é ilusório. Perde-se emprego, isto é fato. Claro que sempre haverá um motivo apresentado plausível, inteligente e lógico, mas a realidade é que a demissão vem e é independente de seu alto desempenho e resultados, da sua qualificação extraordinária ou sua dedicação ímpar.
Então, aceitar ser abusado e não colocar os limites da sua capacidade física, mental e psiquica, sinto informar, não garante nada, ao contrário, pode até acelerar sua demissão porque a deterioração de sua saúde e produtividade, quando acontecerem serão mais do que bons motivos para sua demissão.
Não há dúvida de que o trabalho é uma das maiores fontes de valorização social e contribui significativamente para a construção da autoestima em qualquer ser humano. É também motivo de orgulho ser considerado e reconhecido como alguém trabalhador, esforçado, dedicado. A paixão pelo que se faz é outro ingrediente que nos faz tolerantes ao excesso de trabalho. Isto sem esquecer do senso de responsabilidade.
Todos estes ingredientes podem explicar, em parte, porque somos bastante tolerantes com abusos. Queremos produzir riqueza, aplicar conhecimentos, obter resultados.
Só é preciso relembrar que trabalhar mais é muito diferente de trabalhar bem. Ao contrário. Quando o problema for o processo, a falta de recursos ou a incompetência, de nada adiantará esforço por maior que ele seja. Sem contar que a questão pode ser a inviabilidade das metas colocadas e impostas por quem desconhece a capacidade do sistema que dirige.
Tomar decisões erradas, não ter mais cabeça pra pensar, esquecer coisas importantes ou adoecer são algumas das consequências de um alto stress e do pouco ou quase nenhum espaço para “recarregar” energias. Sem contar que trabalhando muito é quase impossível você se manter atualizado e este poderá ser outro bom motivo para sua demissão.
Para finalizar, a exaustão é acelerada por conta de outros ingredientes do mundo moderno. O fuso horário, que não existe mais neste mundo globalizado, mas o respeito a ele existe sim, embora apenas acima da linha do Equador. Assim como férias regulares, permitidas a você, é claro, desde que sejam de 10 ou 15 dias e com o blackberry ligado, correto?
Tudo precisa ser assim em real time, on line, monitoramento contínuo e ininterrupto, conectividade 24 horas e 365 dias por uma questão de sobrevivência. Afinal a máquina não pode parar. Caso contrário, o acionista não apreciará e migrará seu rico dinheirão para outras paragens. E aí, como você fica?
Talvez com alguma chance de ainda salvar seu casamento, de ver e beijar seus filhos antes que sigam seus caminhos, de resgatar sua saúde plena, crescer em cultura, descobrir o que aprecia e de rever do quanto realmente precisa para viver com significado e dignidade. Ainda a tempo de resgatar sua identidade e o sentido e valor de sua vida.
Nota: Artigo publicado originalmente no antigo site do Instituto Pieron.