Quando o tempo interessa e faz diferença

agosto 15, 2016

Uma leitura do Balanced Score Card

Não, não falaremos sobre administração do tempo. Abordaremos conceitos atuais da Física e sua relação com a administração e os negócios. Alvin Toffler, no prefácio de ‘Order Out of Chaos’, de Prigogine e Stengers (1984), escreveu: ‘Parte da vasta revolução atual, tanto na ciência como na cultura, é a reconsideração do tempo… Nas ciências sociais o tempo permanece em terreno virgem … Mais ainda, cada cultura e cada pessoa tende a pensar em ‘horizontes de tempo’. Alguns de nós pensam somente no imediato. Políticos, por exemplo, são freqüentemente criticados por procurar somente o imediato, resultados de curto prazo … a próxima eleição. Outros de nós pensam a longo prazo.

Estes diferentes ‘horizontes de tempo’ são fontes de fricções políticas e sociais – talvez uma das mais importantes’. E Toffler continua: ‘ …as ciências sociais desenvolveram- se muito pouco na direção de uma teoria do tempo coerente’. E remete o leitor ao seu ‘Future Shock’, onde define durational expectancies – como nossas pressuposições culturalmente induzidas com relação ao quão longo um processo deve ser.Toffler está apresentando o seminal livro de Prigogine e Stengers, que recolocam o tempo como o conceito fundamental para a nova ciência. No mundo mecânico de Newton e de Einstein, o tempo não tem importância em si. Um momento seja no presente, passado ou futuro, é assumido como sendo exatamente como um outro momento. O ciclo infindável dos planetas, por exemplo, pode ir para frente ou para trás sem alterar seus sistemas básicos. O máximo que iríamos obter é uma volta – retorno – seguindo os passos deterministas até então gerados. Por isso os cientistas se referem ao tempo como ‘reversível’.

Com a termodinâmica emergindo no final do século XIX, contudo, aprendemos sobre a perda da energia dos sistemas: entropia. Então, a máquina do mundo newtoniano começa a se aproximar da morte, e o que se segue é que um momento já não é mais como o último. Não se consegue reverter o universo de sua entropia! Os eventos ao longo do tempo não podem substituir a si mesmos. E tudo isto significa que existe uma direcionalidade nos processos físicos, o que Eddington chamou de ‘a flecha do tempo’.

Tempo precede a existência

Prigogine e Stengers rompem com o mundo mecânico e determinista trazendo para a Física a questão do tempo em uma dimensão totalmente nova – ‘o tempo precede a existência’, enfatizam. A tese deles é que processos químicos (da vida) são dependentes do tempo, e são irreversíveis. E processos irreversíveis compõem o que denominam estruturas dissipativas, mas que não necessariamente conduzem à desordem. Estes processos irreversíveis são fonte de ‘novas ordens’ que – associados ao seu caráter randômico e de troca com o meio – levam a níveis mais elevados de organização, como as estruturas dissipativas.

Toffler estava descobrindo nas ciências naturais os conceitos inovadores de Prigogine e de sua equipe, e não se continha em fazer analogias entre estes conceitos e as ciências sociais, políticas, civilização e a condição do próprio indivíduo, reclamando por uma ciência humana coerente a respeito do tempo.

Coincidentemente, Elliott Jaques publicava em 1984 seu também seminal livro ‘The Form of Time’, no qual fundamenta seus conceitos sobre o tempo nos aspectos relativos às estruturas hierárquicas complexas – como as organizações – e também nos traz o conceito de que as pessoas têm capacidade – potencial, na linguagem de recursos humanos – , compreendida pelo que denomina ‘horizonte de tempo’. E propõe uma teoria – hoje já mundialmente reconhecida – acerca de como o tempo se torna tanto uma medida objetiva para as Ciências Humanas, como também a principal referência para se medir a complexidade dos negócios e o potencial humano.

Para Jaques, todos nós temos um projeto pessoal inconsciente definido como nosso time-span (horizonte de tempo). Pensar a curto ou longo prazo, como bem caracterizou Toffler, não é uma questão de interesse. Em muitas situações, muitos são capazes de fato de lidar com ‘certos horizontes de tempo’. Isso nos possibilita identificar diferentes graus do espírito empreendedor.

A capacidade humana se expressa em um horizonte de tempo, o que significa ‘com quanto de incerteza uma pessoa é capaz de lidar tendo de olhar à frente, transformar uma intenção num output específico, trabalhando sem supervisão e usando seu julgamento para conduzir ações e superar obstáculos’. Os horizontes de tempo variam de um dia a três meses no primeiro nível de complexidade, de dois a cinco anos num primeiro nível estratégico, de cinco a 10 anos para um presidente de uma empresa, e de 20 a 30 anos, para um CEO empenhado na tarefa de construir novos valores para futuras gerações.

Horizontes único

Para Jaques, estes horizontes de tempo são inerentes a cada indivíduo. Quando uma pessoa assume uma função, trará seu desempenho e o tamanho da estrutura organizacional ao seu nível atual de capacidade. O horizonte de tempo se torna uma referência significativa e uma pedra de toque para estudos de estrutura organizacional e planejamento corporativo dos recursos humanos.

Para Jaques, estes horizontes de tempo são inerentes a cada indivíduo. Quando uma pessoa assume uma função, trará seu desempenho e o tamanho da estrutura organizacional ao seu nível atual de capacidade. O horizonte de tempo se torna uma referência significativa e uma pedra de toque para estudos de estrutura organizacional e planejamento corporativo dos recursos humanos.

Neste ponto, é inerentemente impossível antecipar o próximo estado do sistema. Prigogine aproxima- se do conceito de direcionalidade, de certo grau de ‘escolha ao nível da matéria’. Pressupõe uma ordem no caos. Assim também é a vida dos decison makers nas organizações.Frente às instabilidades e flutuações do mundo dos negócios, a incerteza deve ser enfrentada e decisões precisam ser tomadas. Elaborar uma decisão não é um processo determinista.

A verdadeira decisão é um processo não linear, dinâmico, com componentes inconscientes (valores, combinações velozes de dados e interpretações, intuições, etc.) e nós (nosso consciente) temos acesso à direção da decisão, e confiamos nela, porque é o melhor que pudemos produzir. O limite delas é nosso horizonte de tempo. Toda decisão é um ato criativo. O momento não irá se repetir e o processo é irreversível. Será necessário colocar planos em ação para transformar a intenção em realização.

Balanced score card (BSC) e tempo

Um dos pontos práticos para a reflexão em relação a uma das ferramentas em evidência é o BSC. Conversando com um colega – entusiasmado pelo processo em si de desdobramento das estratégias organizacionais em planos operacionais – fiz uma observação que o surpreendeu, aparentemente porque nunca havia feito esta correlação.

Minha observação foi simples. O BSC é uma ferramenta que se inicia exatamente com a questão do tempo! Seu processo requer uma visão de cinco anos (cinco anos são o limite entre os Work Levels® IV e V – horizontes de tempo de dois a cinco ou cinco a 10 anos). A produção de uma visão de cinco anos à frente requer uma distinta capacidade humana. Perguntei ainda se a pessoa em questão teria recursos para enxergar essa visão. A partir de uma visão com um projeto de cinco anos, o BSC demanda planos complementares de três anos, de um ano, e assim por diante.

Se minha lógica estiver correta em relação ao vínculo fundamental do BSC com o tempo – relembrando Prigogine: ‘o Tempo precede a existência’ – podemos deduzir que muito provavelmente algumas experiências com o BSC serão bem sucedidas, mas boa parte talvez não. Por quê? Horizonte de tempo e capacidade de enxergar através das incertezas!

O quanto as intenções do BSC, intuídas com base em horizontes de tempo, serão adequadas, só o tempo dirá. E decisões irreversíveis, que irão alocar recursos, mobilizar pessoas, envolver comprometimento em diferentes escalas na organização, terão sido tomadas! As ações com base no BSC serão verificadas em sua efetividade no máximo daqui a cinco anos! E o que são cinco anos na vida corporativa?


Nota: Artigo publicado originalmente no antigo site do Instituto Pieron.

 

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