Esta semana, numa das reuniões que temos mantido com a rede global do Bioss International, surgiu um comentário interessante:
Antes era proibido não ter orçamento anual…
… agora o proibido é tê-lo.
O orçamento está em social distancing, trancado em casa, esperando a hora de voltar.
E o que mudou?
Nada de importante. Mas é claro que uma crise do tamanho da que estamos vivendo ajuda a deixar algumas coisas mais óbvias.
Primeiramente: o orçamento tem a sua utilidade.
Não estou aqui pregando a sua morte (mesmo que isso não fosse uma ideia tão ruim para muitas empresas).
Mas (há sempre um “mas”) o orçamento também acaba criando um sentimento de falsa segurança.
Já construí muitos modelos financeiros na minha vida. Frequentemente, esses modelos entram em detalhes minuciosos com relação a receitas, crescimento, composição de custos, impostos etc. e ocupam centenas ou milhares de linhas numa planilha de Excel.
Quem olha pensa: “puxa, com esse nível de detalhe, essas projeções devem ser bastante confiáveis”. E é aí que está que está o sentimento de (falsa) segurança.
A “vida real” acontece fora do Excel. E os elementos que realmente tem o poder de jogar projeções e orçamentos por água abaixo estão invariavelmente fora da planilha.
No ciclo de planejamento de 2019-2020, não se fizeram modelos com um cenário coronavírus; em 2007, não haviam orçamentos com o cenário crise do subprime; e o mesmo vale para o cenário bolha das ponto-com, para o cenário de crise Russa, para o cenário WW2, para o cenário gripe espanhola e para o cenário queda de Roma.
(esses modelos, quando são feitos, estão olhando para trás — o famoso backtesting)
Se usássemos modelos mais realistas, trabalharíamos com cenários de descontinuidade. Alguns prevendo a falência no ano seguinte; outros, prevendo crescimento e rentabilidade formidáveis.
Quando nos acostumamos com tempos de calmaria, a tendência pode ser gerenciar aqueles elementos que estão bem mapeados numa planilha. Gerenciar a continuidade. Reduzir a complexidade do negócio para algo que seja mais manejável.
Mas o mundo não está nem aí para a suas macros no Excel.
Em momentos de turbulência, jogar o orçamento no lixo é um ato simbólico: deixa claro que o gerenciamento tem que ir muito além do que é orçado e planejado.